"Quem concordará com o que vocês estão dizendo? A parte de quem ficou com a bagagem será a mesma de quem foi à batalha. Todos receberão partes iguais" (1 Samuel 30.24)
Os amalequitas aproveitaram que Davi e seus 600 homens saíram em batalha junto com os filisteus e atacaram a cidade onde eles habitavam, levando as mulheres, crianças, jovens e idosos como prisioneiros. Quando eles chegaram e viram a cidade incendiada, choraram até não terem mais força, e decidiram - após consultar o Senhor - perseguir o inimigo. Porém, um terço dos guerreiros de Davi estava exausto demais para atravessar o ribeiro de Besor. Davi seguiu com 400 homens, atacou os amalequitas, recuperou os prisioneiros e ainda tomou rebanhos dos inimigos como despojo.
Quando retornaram, os 400 que foram à guerra devolveram os familiares dos 200 que ficaram, mas decidiram não repartir os bens recuperados e tomados dos amalequitas, alegando que, por mérito, eles não poderiam receber, uma vez que não lutaram. Davi, porém, interviu e estabeleceu um decreto, pelo qual os despojos da guerra seriam divididos entre todos, tanto os que lutaram quanto os que não lutaram.
O que isto significa? Davi não estava, ao fazer isto, impedindo que a justiça fosse feita entre seus liderados? Não! Davi mostrou que Meritocracia é diferente de Justiça. E que, no Reino de Deus, a justiça não se dá por meio do merecimento.
Jesus também defendeu um tipo de justiça não-meritocrática. Em Mateus 20.1-16, ele conta uma parábola na qual um homem sai a contratar trabalhadores para sua vinha, e combina o salário de 1 denário com todos eles, tanto os que começam a trabalhar cedinho, quanto com os que pegam serviço por volta das 5h00 da tarde. Os que começaram cedo questionaram o fato de receberem o mesmo salário daqueles que começaram tarde, mas o dono da vinha reclamou seu direito de fazer o que quiser com seu dinheiro, e pagar a cada um o que foi combinado, de modo que os últimos se tornam os primeiros, e os primeiros se tornam os últimos.
Jesus não inventou isto do nada, como Davi também não inventou. São inúmeras as circunstâncias, desde a criação, na qual o filho mais novo recebe a bênção no lugar do mais velho, por exemplo. Esta "inversão" de mérito mostra que a justiça de Deus não é baseada no mérito, mas na graça e na vontade de Deus em favor dos mais fracos.
Este episódio de 1 Samuel 30, bem como a parábola de Mateus 20, ilustra bem a forma como Deus estabelece a justiça no Seu Reino, tipificado aqui no coração de Davi. Assim como os 200 guerreiros mais fracos que estavam exaustos e não conseguiram acompanhar os 400 mais fortes, receberam igualdade de benefícios na divisão dos despojos... assim como os trabalhadores que pegaram serviço às 5h da tarde receberam pagamento de 1 denário tal como os trabalhadores que "ralaram" o dia inteiro... assim também, a vida eterna e os dons do Espírito são concedidos gratuitamente, a todo aquele que crer, não importa se a pessoa tenha vivido toda uma vida dedicada ao Evangelho, ou se ela se converteu e foi perdoada no dia de sua morte.
O filho pródigo que torrou a grana do pai e depois voltou e o irmão mais velho que nunca deixou de ser fiel têm ambos direito à mesma herança do pai. O ladrão crucificado ao lado de Jesus e os discípulos que o acompanharam desde o início do seu ministério receberão ambos a mesma bênção de salvação e glória na Nova Jerusalém. No Reino de Deus não há lugar para meritocracia. "Tempo de igreja", experiência, funções exercidas, títulos, ministérios, idade, tempo dedicado, nada disso faz que alguém seja "preferido" por Deus em relação a outro, seja neste mundo ou no porvir. Ninguém pense que vai receber algo de Deus por mérito.
A justiça de Deus é baseada na Sua graça e favor, não na "capacidade" ou "habilidades" do servo. Se alguém serve a Deus pensando em obter algo mais de Deus por isso, essa pessoa não está agindo por principios do Cristianismo. O nome disso é Espiritismo.
Não seja um cristão com princípios espíritas! (Não estou atacando o Espíritismo: apenas ressalto que se você quiser ser espírita, seja espírita e eu te respeitarei, mas se quiser ser cristão, seja simplesmente cristão!) Não doe por causa do que você vai receber em retribuição. Apenas doe por amor! Não trabalhe pensando no elogio que você receberá das pessoas nem do Senhor! Simplesmente sirva por considerar o seu próximo tão importante quanto você. Não queira "comprar" Deus, nem barganhar com Ele. Apenas receba o que Ele te der por Sua graça e misericórdia, e entregue-se a Ele e a Sua obra simplesmente por amor a Ele e às pessoas, do jeito que elas são. Este é o coração do Cristianismo! Ainda que você entregue tudo o que você tem e até mesmo o seu corpo para ser queimado em favor de alguém, se não tiver amor, de nada adianta (1 Coríntios 13.3)!
É por isso que só o Espírito Santo pode transformar uma pessoa e fazer dela um verdadeiro cristão. Não há lógica humana capaz de convencer alguém a amar! Tudo é movido pela graça. Para o cristão, não há meritocracia, não há disputa, não há competição. Tola e sem sentido é a interpretação de alguns, a cerca de mansões e casebres no reino dos céus, atribuídos como galardão maior ou menor conforme o mérito. Pois ainda que isso fosse verdade (o que eu duvido!), se eu viesse a morar numa mansão e você num casebre, eu te levaria pra morar comigo! Não importa quantas estrelinhas vão ter na minha coroa, tudo o que eu quero é que você conquiste a coroa, como eu já conquistei!
É difícil ao nosso orgulhoso e competitivo coração entender a graça divina e praticar a generosidade e o desapego provenientes de uma mente santa e um coração amoroso. Enquanto o Reino de Deus é totalmente fundamentado em amor e bondade, a religião é movida por interesses, igrejas são abertas por avareza, ministérios trabalham por vaidade e obreiros se movimentam por dinheiro. Pense: Quantos pastores fazem retiradas eclesiásticas mesmo trabalhando secularmente com boa renda? Quantas igrejas "competem" entre si com cultos idênticos e de mesma fé localizadas a poucos metros umas das outras? Quantas pessoas só vão a suas igrejas quando é a vez delas de pregar, cantar, tocar ou dançar, mas são incapazes de ouvir outro pregador, outro cantor, outro músico ou artista? São competidores? Concorrentes entre si? Querem vaidosamente se gabar em ser "diferentes" e "mais abençoados"? "Quem concordará com o que vocês estão dizendo? A parte de quem ficou com a bagagem será a mesma de quem foi à batalha. Todos receberão partes iguais" (1 Samuel 30:24). Se você não fizer o que você faz por amor sem segundos interesses, significa que você ainda não entendeu como funciona o Reino de Deus. Se você se move por méritos, comparações, ou mesmo por vaidade e dinheiro, tá faltando sabedoria!
Nem mesmo os apóstolos tinham clareza sobre isto! Discutiam entre si para saber quem seria o maior no Reino de Cristo. Dois deles chegaram a causar grande indignação dos demais ao pedir tronos ao lado do próprio Jesus (Marcos 10.37,41). Mas o Mestre lhes mostrou que eles não sabiam o que estavam pedindo (Marcos 10.38a). Jesus os chamou e disse: "Vocês sabem que aqueles que são considerados governantes das nações as dominam, e as pessoas importantes exercem poder sobre elas. Não será assim entre vocês. Pelo contrário, quem quiser tornar-se importante entre vocês deverá ser servo; e quem quiser ser o primeiro deverá ser escravo de todos. Pois nem mesmo o Filho do homem veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos" (Marcos 10.42-45). Já se passaram 2000 anos desde que os discípulos valorizaram a vaidade e Jesus lhes ensinou a humildade, mas até hoje não aprendemos isto! Já passou da hora de crescermos e colocarmos em prática o verdadeiro Evangelho!
Que o Senhor nos abençoe e nos leve a uma conversão genuína. Que tenhamos o coração de Davi, o coração de Jesus, o coração de servos uns dos outros... Que aprendamos a diferença entre mérito e justiça. Que aprendamos a viver o amor de Deus!
Graça e Paz!
blogdopastortulio.blogspot.com.br
Sensacional, Parabéns pelo estudo. Jesus continue te abençoando Pr Tulio.
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